Dando prosseguimento às nossas exposições sobre “Como se forma um padre?”, começamos a meditar sobre as dimensões da formação, ou seja, quais são os critérios trabalhados durante a formação inicial de um presbítero. Neste texto, meditaremos sobre a segunda dimensão da formação, que é aquela que distingue o sacerdote de qualquer outra profissão: a dimensão espiritual.
“O sacerdote é um outro Cristo”, diz um antigo adágio. Ora, antes de ser qualquer outra coisa, o padre é um homem de Deus: sua primeira vocação é unir-se perfeitamente ao seu criador e configurar-se inteiramente a Cristo. Assente nisso, “a formação espiritual é orientada a alimentar e sustentar a comunhão com Deus e com os irmãos, na amizade com Jesus Bom Pastor e numa atitude de docilidade do espírito”[1]. “Esta íntima relação forma o coração do seminarista para aquele amor generoso e de oblação que representa o início da Caridade Pastoral”.[2] Logo, é fácil entender a importância da espiritualidade dentro dos seminários, os quais são, em palavras simples, casas de oração na qual o seminarista trilhará um caminho progressivo de vínculo com o Divino Mestre.
Às vistas desse fim, “a formação espiritual acontece por etapas”[3], de maneira que “o formando não passe à etapa seguinte sem antes ter demonstrado um efetivo crescimento em sua vida espiritual.”[4] Nessa perspectiva, a vida espiritual começa com a “Iniciação cristã”, uma vez que “antes de ser presbítero, é preciso ser discípulo”[5]. Assim sendo, a etapa propedêutica deve oferecer uma verdadeira Iniciação à vida Cristã, progressiva e sistemática, de maneira que complemente uma possível frágil formação religiosa e humana dos candidatos. A partir disso, é possível aprofundar a oração.
“O centro da formação espiritual é a união pessoal com Cristo, que nasce e alimenta-se de modo particular na oração silenciosa e prolongada”[6]. Assente nisso, o seminário dispõe de diversas práticas recomendadas pela Igreja e atestada pela vida dos santos; sendo as principais: 1) Leitura orante da palavra de Deus (Lectio Divina); 2) Recepção assídua dos sacramentos; 3) A Liturgia das horas e 4) os exercícios espirituais anuais.
“Ignorar as escrituras é ignorar Cristo”, exorta-nos São Jerônimo. Ora, antes de ser servidos da Palavra de Deus, será discípulo e ouvinte. “Por isso, com frequência, fará a leitura meditada e orante da Palavra de Deus (Lectio Divina), que é a escuta humilde e cheia de amor daquele que fala. É, de fato, à luz e pela força da palavra de Deus, que pode ser descoberta, compreendida, amada e abraçada a própria vocação. A familiaridade com a Palavra de Deus facilitará o itinerário de conversão não apenas no sentido de separar do mal para aderir ao bem, mas também no sentido de alimentar no coração os pensamentos de Deus”[7]
Além disso, a recepção assídua dos sacramentos guarda uma parte essencial na espiritualidade presbiteral. Com efeito, “o futuro presbítero, que será o principal animador e servidor da celebração litúrgica, tenha uma participação consciente e ativa na liturgia”[8]. Nesse contexto, deve-se ressaltar de forma especial o culto a eucaristia: “os candidatos à ordenação devem, antes de mais, ser formados a uma fé muito viva na Eucaristia”[9]. Ademais, não se deve esquecer que “a celebração frequente do sacramento da penitência, preparado através de um quotidiano exame de consciência, torna-se ocasião para que o seminarista possa reconhecer , com humildade, as próprias fragilidades”[10], como também “experimentar a alegria de ser perdoado pelo Senhor”.[11]
“Na vida de um presbítero não deve faltar a Liturgia das Horas, que representa uma verdadeira e própria “escola de oração” também para os seminaristas, os quais, aproximando-se gradualmente à oração da Igreja, através do ofício divino, aprendem a apreciar a sua riqueza e beleza.”[12]
Por fim, os exercícios espirituais anuais, mais conhecidos como retiro espiritual, configuram um “tempo de profunda revisão no encontro prolongado com o Senhor , vivido num clima de recolhimento e silêncio”[13]. Tais retiros estimulam uma interiorização para ouvir regularmente a voz do Pastor que ressoa nos corações, bem como na consolidação da decisão de consagrar a própria vida a Cristo.
Tudo isso é somente ínfima parte dos métodos que a sabedoria e experiência da Igreja recomenda aos candidatos ao sacerdócio, dos quais não é possível expor aqui a não ser sinteticamente. Não obstante, já é possível delinear como deve ocorrer a vida espiritual no seminário: uma íntima e progressiva união a Cristo, Mestre e Sacerdote do povo de Deus.
[1] Presbyterorum Ordinis n.12
[2] RFIS n.101
[3] DOC 110 CNBB – Diretrizes para a formação dos presbíteros na igreja no Brasil n.209
[4] Ibid n.209
[5] Ibid. n.210
[6] C.I.C., nn 2709-2719
[7] CNBB DOC 110 – n.212
[8] Ibid. n.213
[9] RFIS, n.104
[10] Ibid, n.106
[11] Ibid. n.106
[12] Ibid, n.105
[13] Ibid, n. 108