
Terça-feira da 13ª Semana do Tempo Comum – Ano ímpar
Gn 21,5.8-20
Sl 25 (26)
Mt 8,28-34
Homilia originalmente preparada para as Irmãs Missionárias da Caridade
Na Primeira Leitura, lemos o relato da destruição de Sodoma e Gomorra. Vamos meditar brevemente sobre alguns detalhes dessa narração.
Qual foi a causa da destruição das cidades? O pecado. Segundo a Palavra de Deus, o pecado dessas cidades agravara-se demais (cf. Gn 18,20). Isso fez com que chegasse aos Céus um “clamor”. Os antigos católicos, com base na Bíblia, falavam da existência de quatro pecados que “clamam” aos Céus: assassinato voluntário; pecado sensual contra a natureza; oprimir os pobres e as viúvas; negar o salário aos que trabalham. Tradicionalmente, diz-se que em Sodoma e Gomorra abundava o pecado do segundo tipo. Não por acaso, na linguagem jurídica, o termo “sodomia” tornou-se sinônimo de relação homossexual.
De fato, quando Ló recebeu em sua casa a visita de dois anjos do Senhor em forma humana, vários homens foram até lá para assediá-los. De acordo com Gn 19,4 eram homens de todas as idades, desde jovens até idosos. Porém, recentemente, um estudo da Pontifícia Comissão Bíblica (2019) ofereceu uma explicação um pouco diferente do pecado dos habitantes de Sodoma. Segundo essa nova visão, o grande pecado da população de Sodoma era maltratar os estrangeiros. Não importa tanto que este maltrato tenha sido de cunho erótico. O mais determinante é que tenha havido intimidação, falta de acolhida, submissão. Exatamente assim se explica o contraste entre a conduta de Ló e a conduta dos demais: no meio de um povo hostil e malvado, o justo Ló abre as suas portas para praticar uma obra de misericórdia corporal de grande relevância: oferece pousada aos forasteiros. Não por acaso, Deus resolve salvá-lo da destruição, juntamente com sua família.
O Salmo 25 bem poderia ter sido entoado por Ló: “Não junteis a minha alma à dos malvados, nem minha vida à dos homens sanguinários; eles têm as suas mãos cheias de crime”.
Chama também atenção a popularidade do pecado. Apenas uma família tinha abertura de coração para amar o próximo como convém. Uma população inteira estava fechada; uma sociedade inteira degenerada; um povo inteiro moralmente degradado. É o que alguns teólogos chamam de pecado social, ou seja, um pecado cometido de maneira tão universal que se torna cultural, geral, estrutural. Em nossos dias, não vemos algo de semelhante? Dia após dia, vão-se perdendo os valores cristãos e os princípios inegociáveis. Uma outra cultura vai ganhando forma. Uma cultura carregada de sentimentalismo, mas carente de verdadeiro amor. Uma cultura que São João Paulo II rotulou com o dramático título de cultura da morte. Não é fácil escapar de tal tendência: tudo em nosso redor tenta nos convencer.
Os anjos do Senhor, porém, não cessam de nos visitar. E como a Ló, também a nós dirigem essas palavras: “trata de salvar a tua vida. Não olhes para trás, nem te detenhas em parte alguma desta região”. Ó! Senhor, como é grande a Tua Misericórdia! Fizeste para nós uma rota de fuga e envias todos os dias mensageiros para nos advertir, pessoas que nos tomam pelas mãos para nos conduzir (cf. Gn 19,16).
Triste é o caso da mulher de Ló. Começou bem, dando as costas para a maldade, a mentira e o engano e correndo para o abrigo fornecido por Deus. Mas aquela pobre mulher, cheia de curiosidade vã, talvez com apego àquela cidade e ao mal que ali grassava, olhou para trás. Como consequência, tornou-se estátua de sal. Curiosamente, Sodoma e Gomorra estavam localizadas nas proximidades do Mar Morto: um mar que, de tão salgado, não permite a vida.
Senhor, em Tua clemência, liberta-nos da cultura da morte. Protege-nos contra os atrativos de um mundo de falsidades e de pecado que nos rodeia e nos tenta seduzir. Leva-nos, ó Deus de Bondade, para o lugar da Verdade e da Vida, onde reina o amor. Amém.
Pe. Ricardo Petroni Smiderle Passamani
Terça-feira da 12ª Semana do Tempo Comum
*Homilia preparada para o segundo dia do Tríduo de São João Batista.
Gostaria de partilhar, no dia de hoje, alguns pensamentos sobre as nossas escolhas.
Na Primeira Leitura (Gn 13,2.5-18) ouvimos o relato da separação entre Abrão e seu sobrinho Ló, em decorrência do tamanho de seus rebanhos e de desentendimentos entre seus pastores. Abrão fez uma oferta generosa a Ló: “Estás vendo toda esta terra diante de ti? Pois bem, peço-te, separa-te de mim. Se fores para a esquerda, eu irei para a direita; se fores para a direita, eu irei para a esquerda’”.
Então, Ló, gozando de ampla liberdade para escolher, “viu que toda a região em torno do Jordão era por toda a parte irrigada – isso antes que o Senhor destruísse Sodoma e Gomorra -, era como um jardim do Senhor e como o Egito, até a altura de Segor. Ló escolheu, então, para si a região em torno do Jordão, e foi para oriente”. Portanto, o critério utilizado por Ló foi totalmente material. A região que lhe parecia mais adequada para a prosperidade foi a escolhida. Desafortunadamente, foi morar próximo a Sodoma e, posteriormente, mudou-se para dentro da cidade. Mais tarde, devido à situação moral degradante da região, o Senhor destruiu Sodoma por meio de uma “chuva de enxofre e de fogo” (Gn 19,24).
Assim, o tempo mostrou que a escolha de Ló não fora a mais apropriada. Para escolher sabiamente devemos sempre ter em conta também o critério espiritual. Na hora de decidir com quem vamos casar, onde vamos morar, qual vocação seguiremos, etc., é necessário pensar nas consequências espirituais para escolher aquilo que mais irá favorecer a nossa santificação e a nossa amizade com Deus. Este é o critério maior de todos, que não pode ser suplantado por nenhum outro. Tomar decisões esquecendo aquilo de mais precioso que temos seria como atirar pérolas aos porcos ou lançar aos cães as coisas santas (cf. Mt 7,6).
Celebramos hoje a Memória facultativa de dois grandes santos: São João Fisher e São Thomas More. Ambos escolheram Deus! Escolheram defender a verdade, mesmo às custas da liberdade e da própria vida.
O primeiro, Bispo; o segundo, pai de família. Ambos condenados à prisão numa torre e, em seguida, à morte por decapitação. Perderam a vida, mas salvaram suas consciências e, assim, suas almas, pelo que mereceram receber a coroa de glória no Reino dos Céus. De lá, intercedam por nós para tomarmos as nossas decisões com sabedoria e coragem.
Pe. Ricardo Petroni Smiderle Passamani
Terça-feira da 11ª Semana do Tempo Comum
Hoje temos oportunidade de avaliar como anda o nosso amor ao próximo. A Palavra de Deus nos apresenta como que dois graus de perfeição neste quesito.
O Apóstolo Paulo, na Primeira Leitura (2Cor 8,1-9), pede aos Coríntios que sejam generosos e enviem ajuda financeira para os cristãos de Jerusalém, a exemplo do que fizeram os fiéis da Macedônia, os quais “indo além de nossas expectativas, colocaram-se logo à disposição do Senhor e também à nossa, pela vontade de Deus”. A comparação foi feita para estimular a Igreja de Corinto, numa sadia competição de caridade, por assim dizer. O próprio Apóstolo informa: “Não é uma ordem que estou dando; mas é para testar a sinceridade da vossa caridade que eu lembro a boa vontade de outros”.
Este tipo de amor ao próximo poderia ser chamado de amor aos amigos porque se trata de ajudar àqueles que estão caminhando juntos, dividindo a mesma esperança e em busca dos mesmos objetivos.
Porém, no Evangelho (Mt 5,43-48), Nosso Senhor Jesus Cristo fala de duas situações. Uma, própria do Antigo Testamento, seria a seguinte: “Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo”. Mas, pede aos seus discípulos para ir além! Pede para amar os amigos e também os inimigos: “Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem”. Para um cristão, o mandamento de amar o próximo não se resume a amar os amigos, mas inclui o amor aos inimigos.
Infelizmente, ao olharmos para a nossa vida, vemos que, algumas vezes, não amamos nem sequer os nossos amigos ou parentes. Somos pouco generosos até mesmo para com eles. Como estamos distantes de cumprir o mandamento do amor ao próximo com a perfeição que Jesus pediu! Da mesma maneira que os Coríntios, também nós somos chamados a testar a sinceridade de nossa caridade.
Há um caminho a ser percorrido na escola do amor. Aprender a amar os amigos e, em seguida, aprender a amar os inimigos. Mas por que deveríamos amar os que nos perseguem? Que bem poderia haver nisso? Não seria pedir demais?
Quando São Thomas More estava na prisão, ele compôs uma bela oração. O último pedido era o seguinte: “Dai-me a vossa graça, meu Senhor, para ter os meus piores inimigos como os meus melhores amigos, pois os irmãos de José nunca lhe teriam feito tanto bem com seu amor e favor como fizeram com seu ódio e maldade”.
De fato, este José mencionado na oração, tornou-se um homem próspero e respeitado no Egito. Exatamente o contrário do que queriam seus irmãos ao lançá-lo na cisterna (cf. Gn 37,23-28). Aqueles que tentam nos fazer mal, sem saber, acabam nos prestando favores. Afinal de contas, “tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8,28).
(Reflexão originalmente escrita para as Irmãs Missionárias da Caridade)
Pe. Ricardo Petroni Smiderle Passamani