Há poucos dias numa conversa livre com meu amigo que tanto admiro, Padre Dauri Batisti, ele me dizia que Michel Foucault acenava para a possibilidade de investimento na vida como a nossa obra de arte. Esse pensador assim dizia: “O que me surpreende, em nossa sociedade, é que a arte se relacione apenas com objetos e não com indivíduos ou com a vida; e que também seja um domínio especializado, um domínio de peritos, que são os artistas. Mas a vida de todo indivíduo não poderia ser uma obra de arte?” Essa conversa me levou a pensar de maneira mais intensa e não consegui evitar de colocar em forma de artigo para dividir com as pessoas um pouco das reflexões.
E essa conversa nasceu do meu comentário às fotos que o Padre Dauri anda fazendo e postando nas redes sociais. Eu lhe perguntava como conseguia cenários tão lindos! Parece que ele hoje escreve em cores, em cenários, em imagens, e disponibiliza ao mundo das redes. Imaginava eu que ele estaria fazendo algum curso de fotografia. Apenas disse que usava os recursos que uma câmera de celular disponibiliza e absorve o que a natureza lhe oferece.
Minhas reflexões foram acontecendo em borbotões. Imaginando que minha vida estivesse sendo construída como uma casa, como seria sua arquitetura? Ela poderia ser uma casa com muita luz, muita ventilação, muita leveza, firme com bons alicerces, e as pessoas ao passarem por ela desejassem ver, visitar, entrar. Como é bom saber que há pessoas que desejam entrar em nossas vidas! Mas sabemos que podemos nos tornar verdadeiros caixotes, feios, ameaçadores, que afugentam os visitantes. Que triste! E muitas pessoas assim vão adoecendo, caindo em depressão, enchendo-se de drogas, etc.
Também a vida poderia ser um quadro. É bom não pretender ser um Picasso, um Monet ou algo parecido. Um pouco de humildade faz bem! Querer ser o máximo ao se desejar ser uma pintura pode tornar-se uma decepção. Podemos borrocar todo o quadro, parecendo mais um espantalho que uma obra de arte. Em suma, cada um pode continuar esse caminho reflexivo tentando um plano para transformar a sua vida numa obra de arte, seja lá qual for. O mais importante é que seja algo apreciado e admirado pelas pessoas.
Ainda pensei mais uma coisa. Ninguém constrói uma obra de arte para esconder, guardar numa gaveta de um armário empoeirado e sujo. As obras de artes são expostas em museus, em salas especiais, em praças, embelezando a vida como um todo. Cada obra de arte assim exposta desperta o pensamento dos admiradores que buscam olhar, interpretar, ver o que significa cada traço. Sendo assim a arte não é algo a se descartar. Ela precisa ser preservada, às vezes, recuperada.
A vida como arte expande nossa visão de mundo. Expande a criação de Deus. O livro do Gêneses poderia completar aquela frase dita pelo criador dessa forma: “E viu Deus que tudo era bom”, e belo, completaríamos nós. Por que toda a criação é boa e bela. Tantas vezes os homens se referiram a Deus como um arquiteto, um artista.
Porém, nenhuma obra de arte se reduz a si mesma. Uma linda casa isolada seria admirada por quem? A arte se constitui num conjunto. Toda exposição de obras compõem um espaço com diversas obras. Não estão competindo entre si. Cada quadro busca ser o que é aos que olham, aos que contemplam. A arte se doa indefinidamente para ser olhada. E penso mais como seria se cada obra que somos também fosse isso! Doação gratuita para admiração! Doação gratuita para a pura beleza.
Sendo nossa vida uma obra de arte com certeza seria bem leve, bem alegre, serena, mesmo que tivesse traços pesados, riscos apressados, tintas escuras. Com certeza não há arte no inferno e com mais certeza ainda os santos tornaram suas vidas uma grande obra de arte. A Igreja quando canoniza uma determinada pessoa não é para que seja adorada, mas admirada como uma obra. Agora entendo um pouco mais da reflexão do padre Dauri: a santificação pela beleza, pela arte. É preciso mudar o mundo para que tudo seja bom e belo. Essa proposta é profundamente cristã.
Edebrande Cavalieri