Na noite escura do mundo onde palavras como “paz”, “diálogo”, “cessar fogo”, “negociação”, tornaram-se blasfêmias por tantos governantes, a Igreja conduzida pelo Papa Francisco desponta como uma pequena luz que se manifesta no modo de ser experiência sinodal. A manhã da Ressurreição que deixa os túmulos vazios desponta a partir do Batismo em um mesmo Espírito. Se somos todos batizados, é preciso reconstruir o caminho da vida através do ministério que se faz serviço.
Um dos grandes entraves na vida eclesial percebido nos diversos momentos de escuta sinodal foi o exercício do poder. O clericalismo presente em alguns sacerdotes e leigos que foram clerizalizados ou se deixaram clericalizar tem dificultado a vivência da fraternidade. Acumulamos muitos entulhos autoritários de comando ao longo da história, reduzindo o espaço das práticas participativas nas comunidades eclesiais.
Para alguns, o poder na Igreja é de origem divina e sendo assim ela não é nada democrática, justificando dessa forma o desenvolvimento de estruturas centralizadoras e excludentes, conhecidas como clericalismo. O momento sombrio do mundo em que o poder se faz com armas de destruição tem na Igreja seu antídoto, sua negação – a vivência sinodal em que todo ministério deve ser exercido como serviço.
O teólogo espanhol Andrés Queiruga afirma que a Igreja é muito mais que uma democracia, pois deveria ser sempre muito mais livre e participativa, mais eletiva e mais deliberativa no modo de caminhar todos juntos. Portanto, ninguém deveria, na Igreja, ousar em mandar em ninguém, pois todos são corresponsáveis.
Quando alguém se coloca na posição de “quem manda aqui sou eu” está negando o caminho da sinodalidade. Quando alguém se reforça no exercício do poder criando privilégios que o torna separado do conjunto, da comunidade, está absorvendo o lado mais sombrio da noite escura do mundo.
O Relatório Síntese do Sínodo nos diz que “o clericalismo, o machismo e o uso inadequado da autoridade continuam a marcar a face da Igreja e a prejudicar a comunhão”, e por esse motivo torna-se essencial uma reforma da Igreja, uma “profunda conversão espiritual e mudanças estruturais”, num diálogo aberto entre os diversos ministérios, entre leigos e padres, entre homens e mulheres.
A amizade social começa no interior das famílias, das comunidades, das paróquias. Antes de ser uma pregação para os outros, é um exame de consciência de nós mesmos. Na comunidade dos batizados não pode haver subordinação, exclusão ou competição. Ninguém reza mais bonito! A Igreja não é lugar para nenhum tipo de disputa ou de comando.
A semente do Sínodo está sendo semeada nas diversas culturas, nas diversas realidades. Por si só não se desenvolverá e dará frutos. O Espírito faz a sua parte, contudo depende da nossa pequena parcela de responsabilidade. Para que essa semente germine, brote, e cresça produzindo frutos sadios e apetitosos é preciso que sejamos bons agricultores, que reguemos as plantinhas da participação fraterna com muito cuidado e carinho. Não é momento para acerto de contas entre grupos. Não somos rivais, inimigos. Somos Povo de Deus que caminha, peregrino, sendo luz na noite sombria do mundo, TODOS JUNTOS.
Edebrande Cavalieri