Bernardo Guadagnin | O tempo, que a ninguém perdoa, demanda que o demos mais atenção a cada dia, fazendo-nos ater menos à nossa história. Assim acontece quando nos referimos com rotina à “Reta da Penha”. Esquecemo-nos de como a ação de Nossa Senhora da Penha fora – e ainda é – importante na vida de cada capixaba. De forma análoga, a posse dos “navegantes” em geral pela Avenida de Nossa Senhora dos Navegantes também se torna uma grande ironia para nós cristãos. E quanto a São José, santo que se destaca por sua discrição?
Seja fruto do secularismo, mera falta de tempo ou desconhecimento, tal indiferença perante os nomes de ruas, avenidas e hospitais, nos torna cristãos que se afastam de Deus. É como se falássemos “Hospital São Lucas” sem ser pelo coração (Mt 12,34). Tantos são os Josés pelo mundo, muitos dos quais dedicados ao santo mas que depois se esqueceram (ou mesmo nem tiveram conhecimento).
Uma coisa começa ficar clara, a possibilidade de se esquecer tanto pelo bem como pelo mal. São José fora o primeiro a poder se permitir esquecer de tudo quando pensou em abandonar Maria. No entanto, como bom homem que era, justo e aberto à oração, esteve à escuta do Espírito Santo, recebendo portanto a revelação de que aquilo que acontecera com Maria fora obra de Deus. Eis, portanto, o primeiro “esquecimento” de São José perante si próprio. Mal podemos imaginar o que passara por sua cabeça, mas uma coisa é clara, suas virtudes diante da tentação inicial floresceram. Ele se permitiu abrir à graça de Deus. São José assume o papel de guiar Nossa Mãe e ser pai adotivo de nosso Salvador.
Seu segundo “esquecimento” ocorre ainda diante da mesma mensagem no sonho, quando o Anjo informa que José deverá colocar o nome de Jesus ao seu filho. Mais uma vez, São José demonstra pequenez e abre mão da possibilidade de colocar um nome ao seu filho. O seu dispor diante da vontade de Deus através dos sonhos que tivera deixa claro sua intenção em servir ao Senhor.
Enquanto um esquecimento é fruto de nossa indiferença, o esquecimento por parte de São José é fruto da grandeza de sua pequenez. Um homem que se coloca sempre em obediência à vontade de Deus é um homem não apenas de oração, mas que coloca Deus em primeiro lugar com todas as suas forças e capacidades. José não dispunha de um local para Maria dar a luz ao Menino Jesus, mas, como Papa Francisco em sua carta apostólica Patris Corde escreve: “[…] arranja um estábulo e prepara-o de modo a tornar-se o lugar mais acolhedor possível para o Filho de Deus, que vem ao mundo”. Ele não se esquece da revelação de que o menino é o Filho de Deus e se doa por completo para preparar sua chegada, mas se permite ser praticamente esquecido por nós.
Tal discrição de São José é como um reflexo de Deus num espelho, um Pai que é o Amor em Si, que respeita ser esquecido e deixado de lado por cada um. Somente um homem com estas características poderia ser escolhido para ser pai adotivo de Jesus. Só desta forma um santo de tão grande importância se permite ser pouco venerado (ou até mesmo desconhecido pelos católicos). Todo zelo que José teve por Maria e Jesus, suas orações, agonias e árduo trabalho como marceneiro nos mostra um exemplo de Homem que fez parte da grande sagrada família, ao qual o Venerável Fulton Sheen nunca se cansou de venerar em suas apresentações e aulas, escrevendo na lousa antes de qualquer conteúdo: “JMJ” (Jesus, Mary and Joseph).
Rezemos a São José para que ele interceda pelo nosso auto-esquecimento, para que seja sadio, dando espaço somente a Deus, o único que merece toda a glória. Que jamais venhamos a nos esquecer do Deus que permitiu tão grandioso Santo viver em nosso mundo. Que não venhamos a dar nenhum espaço às nossas vaidades e caprichos, apagando-nos, mas imprimindo um novo Cristo vivo em nós.
Bernardo Guadagnin Gonçalves
Seminarista do 2º ano de Filosofia;
Paróquia de origem: São Camilo, Mata da Praia, Vitória – ES;
Paróquia de pastoral: Santíssima Trindade, Vila Capixaba, Cariacica – ES.