Semana passada iniciamos um caminho para repensar a sensação de certa acomodação que muitos entre nós sente ao ter se “acostumado” com a Quaresma. Muitos olham racionalmente o evento da janela de suas vidas atribuladas. Há muito deixaram de se tocar pela grandeza do amor dessa realidade histórica da vida e missão de grande sofrimento de Jesus, para que pudéssemos ter direito à vida eterna novamente. Semana passada iniciamos nosso caminho reflexivo (https://www.aves.org.br/iniciando-a-quaresma-de-jesus/), do batismo vamos ao deserto:
Por que Jesus seguiu direto para o deserto depois de seu batismo? “E logo Espírito o impeliu para o deserto” (Mc 1,12). O Espírito de Deus, o amor de Deus por Jesus, guiava Jesus para que ele se preparasse para sua missão (Lc 4,1) pois era preciso que Jesus feito homem vivesse livremente toda sua vida na terra sem qualquer pecado (Hb 4,15). Conduzido pelo Espírito Santo, Jesus se recolhe ao deserto para um pleno encontro com a sua humanidade para experimentar o profundo amor de Deus. Precisamos fazer o mesmo para encontrar nosso eixo central e entender a nossa missão aqui na terra: nos recolher para um espaço de silêncio, rezar, jejuar e aprender a ter cada vez mais domínio nas tentações para seguirmos firmes no caminho que Deus escolheu para nós.
Foi parte do plano divino que Jesus fosse tentado pelo inimigo (Mt 4,1). O objetivo de Satanás era fazer com que Jesus viesse a pecar. Um pecado seria suficiente para impedir que Jesus, na sua natureza humana, não pudesse ser o nosso Salvador frustrando o plano de Deus. Ah! Como o diabo queria isso!
Jesus jejuou, um jejum prolongado para dominar as exigências do seu corpo e assegurar que seria capaz de vencer as tentações de se desviar de sua missão. O jejum permite nos libertar das exigências do nosso “eu”, da nossa alma carnal. A nossa alma batalha contra três grandes inimigos:
1º inimigo o Diabo. Satanás é inteligente e explorador das nossas fragilidades. Sabe nossos pontos fracos: a falta de humildade, a soberba de nos acharmos mais especiais, o desejo de poder, de reconhecimento, de conseguir saídas “fáceis” para os nossos problemas… não importa. É nesse ponto frágil que, com astúcia e estrategicamente simulado, o diabo vai nos tentar.
2º inimigo o Mundo. Preciso me recolher das influências do mundo naquilo que me é prejudicial. Quando falamos “mundo” queremos nos referir ao sistema pecaminoso que foi sendo formado pela sedução de Satanás e pelos nossos pecados. Esse mundo para onde Satanás e seus anjos decaídos foram mandados(1 Jo 2,16)
3º inimigo a Carne. A “carne” não é o corpo. Precisamos nos libertar desta visão estreita. “Carne” na Bíblia é o ser humano na condição de fragilidade. A alma carnal é a nossa alma dominada pelas necessidades do corpo. As necessidades da alma carnal são egoístas. “Carne” somos nós nas nossas fraquezas, pelas desordens que herdamos de nossos primeiros pais e as desordens que já cometemos que nos predispõe a outros pecados. Antes do pecado original a alma dominava o corpo. Com o pecado original houve uma desorganização interna, que todos nós herdamos (menos Jesus e Maria) que inverteu esse domínio e o corpo passou a dominar a alma, resultando nesta alma carnal. Nossa alma submetida a Deus é capaz de submeter o nosso corpo. Nossa inteligência se submente a nossa vontade que submente as nossas paixões e sentidos e “tudo fica em paz pelo suave ordenamento de que as coisas estão em seu lugar”!
A oração é a enorme aliada nesse processo. A oração é essencial e complementa o jejum e a penitência para nossa transformação. A prece permite à consciência um retorno da autoconsciência à sua origem (a alma dominando o corpo) e, neste lugar, consegue ter inspiração para sair daquela realidade, retornando ao seu eixo (Ef 6, 11-12). Essa nossa “autoconsciência cognitiva”, nosso eixo, só pode ser restaurada pela ação do Espírito Santo, por isso precisamos orar para nos transformar e transformar nossa realidade.
Concluo expressando a reflexão do Padre Halison Parro da Cidade do Vaticano . Nesse período litúrgico, o Espírito Santo também deseja conduzir-nos para o deserto. Como Jesus, devemos ser dóceis à sua ação, para podermos experimentar o amor de Deus em nossas vidas. É tempo de discernimento espiritual em relação às nossas atitudes, aos nossos limites existenciais e à nossa fidelidade ao Senhor. Muitas vezes, temos medo do silêncio do deserto, pois fugimos de nós mesmos e da verdade de Deus sobre a nossa história. (Https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2019-03/1-domingo-da-quaresma.html)
Vania Reis